– Carlão, acorda!!!
– Ai, menina Ivy! Você me deixa tão farto. Sabe que horas são, não?
– 5h! 😊
– Pra estar com essa carinha me mandando mensagem a essa hora, ou ganhou na loteria e acabou de conferir o bilhete ou… manda a foto!
– Veja com seus olhinhos.
– Muito bem! É quase um bilhete de loteria. E me acordou por causa disso? Não podia esperar até amanhã? Tá indo para o Butão com ele agora? 😡
– Por que Butão?
– Porque é o lugar mais feliz do mundo, não sabia?
– Hum. Não, é que preciso de um parecer seu.
– Lá vem.
– Acredita que ele foi embora de repente?
– Rs. E qual foi a desculpa?
– Que tinha que encontrar o Arnaldo!
– E quem é o Arnaldo?
– E eu sei lá? Encontrar a essa hora da madrugada? Depois de tuuuudo? E outra! Ele mora do outro lado do mundo! Até a gente se ver de novo!
– Ah, menina Ivy. Não fique assim. Os homens não se apegam. Se ele ficasse, ia parecer que vocês já estavam tendo alguma coisa. Que estavam de malas prontas para o Butão. A gente vai embora pra não criar probl… compromisso!
– Mas e o Arnaldo nisso tudo?
– A gente sempre arranja uma desculpa. É a mãe que tem crises de pânico, o estacionamento que vai fechar, a avó que está nas últimas, o pneu do carro que tem um furo lento, o chefe que está esperando um relatório, o prédio que tem toque de recolher…
– Detesto vocês. Um dia mudo de lado do rio!
– Vai dormir e esquece o… como é o nome?
– João.
– Esquece o João. E o Arnaldo também. Amanhã é um novo dia e você está de férias. Conhece outro alguém interessante e nem pensa mais nisso.
– Tá bom. Obrigada pelo parecer. Boa noite, Carlãozinho. Love u. ❤️
– Boa noite.🌙💤😴
Algumas horas mais tarde…
– Bom dia, Carlão!
Ivy encaminhou uma mensagem:
– “Bom dia, Baby! 😍 Desculpe por ontem, mas eu precisava mesmo achar o Arnaldo. Não parei de pensar em você.”
– Muito bem! Mensagem com emoticon. Quer dizer que ele quer mais. – disse Carlão.
– É?
– Sim! Bom dia + emoticon.
– E bom dia + emoticon + Arnaldo?
– Deixa o Arnaldo pra lá.
– Bom, vou ficar na minha. Vou só responder “Bom dia”. E sem emoticon! Pra ele aprender a não me trocar pelo Arnaldo. Onde já se viu! Até porque já estou na praia… E vamos ver como as coisas se desenrolam.
Mas os dias na praia passam de maneira leeeeenta. Em velocidade de estrela do mar. Carregada pra lá e pra cá. Sol de frente. Sol de costas. Espana areia. Entra na água, molha, seca. O celular nem se mexeu. Não tocou. Não vibrou. Nem spam chegou. Liguei e desliguei o Wi-Fi. Devia ser alguma rede pirata. Liguei no 4g. Nada. Reiniciei o aparelho.
– Carlão, me manda mensagem?
– Por que?
– Ah, era só pra testar se meu WhatsApp estava funcionando.
– Ainda tá esperando mensagem do cara? Kkkk.
– Claro que não! Era só pra checar. Vai que algum juiz maluco tenha bloqueado tudo como da outra vez.
– Sossega!
18h, mensagem do João. Uma foto: “Estamos vendo o por do sol.”
Estamos… estamos quem? – pensei.
– Ah, que máximo! Adoro o por do sol. – limitei-me a dizer. Eu detestava o por do sol a partir daquele momento!
Mensagem encaminhada para Carlão.
– Carlão, ele é gay? Ele está com o Arnaldo vendo o por do sol!!! Não comigo! Com o Arnaldo, percebe??
– Menina Ivy, deixa disso. Vai fazer outra coisa. Esse cara deve ser mais um daqueles babacas que você já está acostumada.
– Tem razão. Foco no jantar!
Lá pelas 19h eu estava de volta ao hotel e quase pronta pra sair. Sim. Esquecer. Jantar. Sair. Badalar. Balançar os cabelos. Reluzir. Mas chegou mensagem do João:
– Jantamos hoje?
Tumtumtum. Coração. João. Butão. Agora que eu estava toda toda??
– Ai, João. Já tou quase pronta pra sair. Consegui uma reserva no Palm Beach, na área externa, bem em frente à marina. Quer ir?
– Deixa eu ver aqui no site. Hummm! Parece bom! Guia Michelin!! Moça de bom gosto. 😍
– Vamos então?
– Já confirmo com você. Me dá 5 min.
Reforcei a maquiagem. Abri aquele perfume novo que tinha comprado no freeshop e borrifei algumas gotas estrategicamente pensadas para aquele jantar. Nisso, chegou mensagem do João:
– Ivy, podemos ir a outro lugar?
– Como assim? Não gostou de lá?
– Gostei, mas é que o Arnaldo não come frutos do mar.
– Ah. Então bom jantar pra vocês. – cortei a conversa.
– Carlão! Você tem razão. Ele é um babaca. Tou indo jantar sozinha! #elequepegueoarnaldoe…
– Kkkkkk.
Jantei feito uma rainha. Caminhei pela baía com meus saltos altos, meu vestido tomara que caia preto meio brilhante, o vento contra o rosto puxando os cabelos pra trás junto com os brincos compridos esverdeados… A vida era dos solteiros. Sem vínculos. Sem expectativas. Sem Joãos, sem Arnaldos, sem cobranças. O Butão era ali! Eu era uma pena que tinha nascido para flanar.
Cheguei ao hotel e desmontei na cama. Me esparramei. Cabia uma dúzia de Ívys ali. E era tudo só pra mim! Coloquei a camisola mais sedosa. Porque eu merecia! Aquela sim seria a minha noite inesquecível da viagem.
Embarquei no meu primeiro sonho quando despertei com o bip do celular. Mensagem de WhatsApp. Carlão? Não. João. Mas já passava da 1h!
– Hey, Baby!! 😍 Você tá brava comigo?
– Não, João. Nem teria por quê. A gente não tem nada. O que é uma noite juntos, não é mesmo?
– Quero muito te encontrar. Estou no bar mais bonito da cidade. Só falta você pra ficar perfeito.
– João… eu estava dormindo.
– Vem. Por favor. Olha o que eu acabei de pedir:
E mandou uma foto dela. A minha viúva preferida. A viúva Clicquot!
– Vem logo antes que esquente.
Fiquei olhando meio incrédula para o telefone. O João era louco, não? Mas lembrei daquela outra noite… De cada detalhe. Revi a foto… era tudo um grande mal entendido?
– Carlão…
– Basta! O que foi agora?
– Vamos imaginar assim que o Arnaldo e o João são tipo amigos de infância.
– Hum.
– Você também não ia largar o Arnaldo numa viagem, não é?
– Menina Ivy. Corre que a champanhe tá derretendo. E minha paciência tá chegando no limite com o Arnaldo, o João, você e essa turma toda. Coloca uma roupa bonita e sai!
Peguei “aquele” vestido verde esmeralda. As sandálias de salto agulha mais finos e reluzentes. Refiz a maquiagem. E, em tempo record, cheguei lá: ao bar mais bonito da cidade.
Entrei afobada, estava escuro. Mensagem pra ele:
– Kd vc?
– Aqui no fundo.
Cheguei à mesa e lá estavam eles: João. A viuva Clicquot, meio suada, mas mas quase preservada.
– Ivy, este é o Arnaldo!
Não. Não, não e não!!
– Boa noite. Arnaldo, a gente pode dar um palavrinha? – pedi, antes de qualquer coisa.
– Claro.
– Manja de futebol?
– Sim.
– Arnaldo, se a gente estiver jogando futebol e eu mandar a bola do adversário pela linha de fundo, exceto pelo gol, como se chama isso?
– Escanteio!
– Boa!
– E se um jogador obstruir o avanço de um adversário?
– Daí pode ser falta.
– E se esse jogador jogar o adversário no chão e pisotear suas partes “moles”? Com uma sandália de salto fino assim como a minha? – e apontei.
– Bem, os jogadores usam chuteiras.
– Mas e se usassem sandálias?
– Daí poderia ser até um pênalti, se o jogador estivesse na cara do gol.
– Você já levou um pisão nas partes moles com salto agulha, Arnaldo?
– Jamais.
– Então eu te dou cartão vermelho.
– Como?
– A partir de agora, seremos apenas nós 3 aqui: João, eu e a viúva Clicquot.
– Mas o agressor é expulso, e não o ofendido.
– Arnaldo… – Apontei para os saltos reluzentes das minhas sandálias.
Arnaldo baixou a cabeça e se despediu.
– E pode isso, Arnaldo? – perguntou João meio incrédulo.
– A regra está clara, não Arnaldo? – confirmei com um leve toque do salto alto no seu calcanhar.
– Claríssima.
(Ivy Cassa)